Justiça nega pedido para retirar série 'Tremembé' do ar, mesmo com pedido de R$ 3 mi de Sandrão

Justiça nega pedido para retirar série 'Tremembé' do ar, mesmo com pedido de R$ 3 mi de Sandrão

A Justiça de São Paulo recusou, em caráter de urgência, o pedido da ex-presidiária Sandra Regina Ruiz Gomes, conhecida como Sandrão, para retirar a série "Tremembé" do Amazon Prime Video. A decisão, proferida pela juíza Ana Cláudia de Moura Oliveira Querido, da 1ª Vara Cível de Mogi das Cruzes, foi clara: remover o conteúdo agora seria censura — e isso, no Brasil, não é permitido. Sandrão quer R$ 3 milhões em indenização por danos morais e uso indevido de imagem, alegando que a produção distorceu fatos reais sobre seu envolvimento no sequestro e assassinato de um adolescente em 2003. Mas a juíza não viu, até agora, elementos suficientes para interromper a exibição. O que está em jogo não é só uma série. É o equilíbrio entre liberdade de expressão e direito à imagem — e o Judiciário ainda não decidiu qual lado vence.

"Remover é censura", diz juíza

A juíza Ana Cláudia não apenas negou o pedido. Ela explicou por que, em termos jurídicos, a retirada imediata da série seria inconstitucional. "Remover a série imediatamente configuraria censura, o que não é permitido no Brasil", escreveu ela no despacho. E completou: "A liberdade de expressão deve ser responsável, assumindo danos por eventuais prejuízos". Ou seja: a arte pode ferir, mas não pode ser silenciada só porque alguém se sente ofendido. Isso não é um detalhe técnico. É um princípio da democracia. A série, lançada em outubro de 2023, já tem mais de 1,2 milhão de visualizações no Brasil. Se a decisão fosse favorável a Sandrão, abriria uma porteira para que qualquer pessoa envolvida em fatos reais pudesse exigir a retirada de obras inspiradas — ou até apenas citadas — em suas vidas. Isso teria efeitos em filmes, livros, documentários. Em toda a cultura.

Os fatos que a série mudou — ou inventou?

Sandrão cumpriu pena por um crime brutal: o sequestro e assassinato de um adolescente de 15 anos, em Mogi das Cruzes, em 2003. O caso chocou o país e foi comparado ao de Suzane von Richthofen — de quem ela chegou a dizer, em entrevista: "O tempo em que estive com ela, fui feliz". A série "Tremembé" não é um documentário. É uma ficção inspirada em fatos reais. Mas aí está o problema. Sandrão afirma que a personagem interpretada por Letícia Rodrigues foi construída com elementos falsos: ela teria sido retratada como mais violenta, mais manipuladora, mais sádica do que na realidade. A atriz, por sua vez, fez aulas com um açougueiro para aprender a esquartejar — um detalhe que a produção diz ser necessário para autenticidade. Mas será que isso é arte ou exploração? A juíza não julgou isso ainda. Só disse que não pode decidir sem ouvir os dois lados.

Quem são os réus e o que eles dizem?

Quem são os réus e o que eles dizem?

As empresas ré são Amazon Studios & Produções Ltda. e Medialand Produção e Comunicação Ltda.. Ambas ainda não apresentaram defesa formal — e têm 15 dias para isso, conforme determinação judicial. A Amazon, que já enfrentou processos semelhantes em outros países, costuma defender que produções ficcionais não são biografias. A Medialand, produtora independente, ainda não se manifestou publicamente. Mas fontes próximas à equipe dizem que a série foi feita com base em registros policiais, depoimentos de familiares e entrevistas com ex-presidiários. Nenhum deles, segundo eles, foi Sandrão. A produção não a consultou. E não pediu autorização. Isso, por si só, não é ilegal — mas pode ser considerado abusivo, se houver dano comprovado. É nisso que o processo vai se concentrar agora.

Um caso que pode mudar a forma como a TV conta histórias reais

Isso não é o primeiro caso de uma pessoa envolvida em crimes reais tentando impedir uma obra de arte. Em 2018, a família de Elize Matsunaga, vítima de um crime de ódio em São Paulo, tentou bloquear um filme sobre o caso. Não conseguiu. Em 2021, o ex-presidiário César Augusto, envolvido no caso da "Chacina da Candelária", pediu indenização por uma série da Globo. O tribunal também negou. Mas há uma diferença aqui: Sandrão está em processo de ressocialização. Ela diz que a série está destruindo o pouco progresso que conquistou. Isso não é só sobre imagem. É sobre dignidade. E o Judiciário, em vez de decidir rápido, decidiu ouvir. Essa é a diferença entre justiça e pressa.

O que vem a seguir?

O que vem a seguir?

Nos próximos 15 dias, a Amazon e a Medialand devem apresentar sua defesa. Depois disso, a juíza Ana Cláudia vai analisar o mérito da ação — e não apenas o pedido de urgência. Ela já sugeriu uma audiência de conciliação. Talvez, entre o direito de criar e o direito de não ser retratado como monstro, haja espaço para um acordo. Um pagamento simbólico? Uma nota de esclarecimento nos créditos? Um pedido de desculpas? A juíza não está interessada em apagar a série. Ela quer que o debate aconteça — e que alguém, algum dia, responda pelas consequências. Enquanto isso, "Tremembé" continua no ar. E Sandrão, em silêncio, espera.

Frequently Asked Questions

Por que a juíza não autorizou a retirada imediata da série?

A juíza entendeu que a remoção imediata configuraria censura, violando o princípio constitucional da liberdade de expressão. Para conceder uma liminar, é preciso comprovar risco de dano irreparável e probabilidade do direito — e isso ainda não foi feito. A decisão não absolve a produção, mas adia a análise do mérito para depois da defesa das empresas.

Sandrão tem direito a indenização mesmo sem autorização para uso da imagem?

Sim, mas só se comprovado dano real. O uso de imagem em obras ficcionais não é automaticamente ilegal. O que importa é se a personagem foi criada com intenção de desacreditar, ridicularizar ou causar sofrimento injustificado. A juíza vai analisar se a representação na série é uma distorção deliberada ou apenas uma liberdade artística baseada em fatos públicos.

O que acontece se a Amazon vencer o processo?

Se a produção for considerada legal, a série permanecerá no ar sem restrições. Sandrão poderá recorrer, mas não conseguirá mais pedir a retirada. A indenização de R$ 3 milhões também será negada, a menos que ela prove, em outra fase, que houve má-fé na construção da personagem. O caso, nesse cenário, se encerraria com vitória para a liberdade criativa.

E se Sandrão vencer? A série será retirada?

Provavelmente não. Mesmo se a juíza reconhecer danos morais, a retirada da série seria excepcional. O mais provável é que a Amazon seja obrigada a pagar indenização, acrescentar um aviso nos créditos ou fazer uma declaração de esclarecimento. A Justiça brasileira raramém ordena a retirada de obras já lançadas — a menos que haja violação clara de direitos autorais ou difamação comprovada.

Como essa decisão afeta outras produções brasileiras?

A decisão reforça que a ficção inspirada em fatos reais pode existir sem autorização prévia — desde que não haja intenção de destruir a imagem de alguém. Isso protege documentários, novelas e filmes baseados em crimes reais, como "O Negócio" e "O Clone". Mas também alerta produtores: criar personagens que distorcem a realidade de forma cruel pode, no futuro, gerar processos custosos e danos à reputação da produtora.

Por que a juíza sugeriu uma conciliação?

Porque o processo pode durar anos, e o dano a Sandrão, se real, já está acontecendo. Uma conciliação pode evitar um longo litígio e oferecer uma solução mais humana: um acordo financeiro, um reconhecimento de que a série causou sofrimento, ou até mesmo um apoio à ressocialização. A Justiça não quer apenas julgar — quer resolver.

2 Comentários

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    Cleber Soares

    dezembro 12, 2025 AT 09:47

    Essa série é só mais um lixo que tenta lucrar com o sofrimento alheio. Ponto.

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    Nayane Correa

    dezembro 12, 2025 AT 20:51

    Eu entendo o lado da Sandrão, mas também não dá pra censurar toda obra que retrata um criminoso. A arte reflete a realidade, mesmo quando dói.

    Se todo mundo que fez algo ruim pudesse tirar uma série, a gente nem teria filmes sobre ditadores ou serial killers.

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