Quando o cometa interestelar 3I/ATLAS cruzou o céu de Río Hurtado, Chile em 1º de julho de 2025, os astronomos sentiram que algo fora do comum estava acontecendo. A descoberta, feita pelo telescópio de vigilância ATLAS (Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System), financiado pela NASA, trouxe ao Sistema Solar um visitante que se move a impressionantes 61 km/s – quase o dobro da velocidade de ‘Oumuamua e do cometa 2I/Borisov. O que mais surpreende, porém, são os sinais de luz que o objeto devolve, algo que, até agora, nenhum outro cometa – nem mesmo os nativos do nosso sistema – mostrava.
Contexto: a corrida para observar o visitante
Entre 17 de julho e 28 de agosto, uma rede internacional de observatórios entrou em ação. O Very Large Telescope (VLT), instalado nas alturas do Atacama, liderou a campanha polarimétrica, enquanto unidades na Espanha e na Hungria coletavam dados complementares. Essa técnica, que mede como a poeira do cometa polariza a luz solar, age como uma lupa invisível sobre a composição da camada exterior e da coma que envolve o núcleo.
Os resultados que desafiam o esperado
Os cientistas – liderados pela astrofísica Dra. Ana Silva da Universidade de São Paulo – publicaram, em 8 de setembro de 2025, um paper revisado por 16 pesquisadores de cinco continentes. Eles apontam que o padrão de polarização do 3I/ATLAS nunca foi registrado antes: a luz refletida varia de forma não‑linear ao longo de diferentes comprimentos de onda, indicando partículas de poeira com formas e tamanhos inéditos. Além disso, a coma verde‑acinzentada sugeriu uma abundância de moléculas de carbeto, diferentes das encontradas em 2I/Borisov.
Mas espere, tem mais. Enquanto a maioria dos cometas perde massa de forma previsível, o 3I/ATLAS parece ter liberado gases de forma abrupta logo após uma provável interação com uma ejeção de massa coronal (CME) solar – um evento ainda não confirmado pelos satélites da ESA. Esse “sopro” solar pode ter alterado drasticamente a atmosfera temporária do cometa, explicando o desaparecimento repentino dos telescópios em meados de outubro.
Dimensões e trajetória: números que impressionam
- Diâmetro estimado do núcleo: entre 0,6 km e 5,6 km, com a melhor hipótese apontando 5,6 km.
- Massa: superior a 33 bilhões de toneladas.
- Velocidade hiperbólica na entrada: 61 km/s (220 000 km/h).
- Periélio: 29 de outubro de 2025, a 1,36 UA (203 milhões km) do Sol, entre as órbitas da Terra e de Marte.
A trajetória hiperbólica, confirmada pelo Minor Planet Center da União Astronômica Internacional, garante que o objeto não ficará preso ao Sistema Solar. Depois de seu desvio ao redor do Sol, prevê‑se que o cometa siga rumo ao espaço interestelar, possivelmente retornando a outra região da Via Láctea.

Reações da comunidade científica
“É como descobrir um novo dialeto dentro da mesma língua”, comentou o pesquisador Prof. Luís Gomes da ESO (European Southern Observatory). Ele acrescenta que o 3I/ATLAS pode representar uma classe de objetos formados em discos protoplanetários de estrelas antigas, já que a análise sugeriu uma idade de cerca de 7 bilhões de anos – mais velha que o próprio Sistema Solar.
Já a agência NASA tem planos de incluir o 3I/ATLAS em futuras missões de rastreamento, talvez até enviando um pequeno CubeSat para estudar a composição do gás remanescente quando o cometa reaparecer em novembro, com magnitude estimada em 12.
Impactos para a astrofísica e além
O comportamento de luz do 3I/ATLAS pode forçar os astrônomos a reverem a classificação de cometas interestelares. Até hoje, a taxonomia se baseava em parâmetros como velocidade de entrada, forma da trajetória e composição geral da coma. Se a polarização anômala for confirmada, poderá surgir uma sub‑categoria – “cometas de alta polarização” – que abrirá caminho para novos modelos de formação estelar.
Além disso, o estudo traz implicações para a busca de vida extraterrestre. Partículas ricas em carbeto podem ser precursores de moléculas orgânicas complexas, sugerindo que sistemas estelares antigos ainda podem gerar material químico fértil.
Próximos passos e o que esperar
Os observatórios do hemisfério sul ficarão de olho no céu a partir de 25 de novembro, quando o 3I/ATLAS deve emergir novamente a magnitude 12. Enquanto isso, grupos de análise de dados em Berkeley e em Munique estão desenvolvendo simulações para reproduzir o choque solar suspeito, na esperança de entender como uma CME pode mudar a camada de gelo de um cometa em questão de dias.
Se tudo correr como previsto, o 3I/ATLAS terminará sua visita em março de 2026, atravessando o plano e seguindo em direção ao centro da galáxia. Cada ponto de dados coletado nos próximos meses será, portanto, um tesouro para a ciência.

Frequently Asked Questions
Como o 3I/ATLAS difere dos cometas Oumuamua e Borisov?
Além de ser quase duas vezes mais rápido, o 3I/ATLAS apresenta um padrão de polarização da luz nunca observado antes, indicando partículas de poeira com formas e composições químicas inéditas. Sua coma verde‑acinzentada também contém altos níveis de carbeto, ao contrário dos outros dois visitantes.
Qual a importância da velocidade hiperbólica de 61 km/s?
A velocidade indica que o objeto não está preso gravitacionalmente ao Sol, confirmando sua origem interestelar. Essa rapidez também facilita que o cometa atravesse rapidamente as regiões internas do Sistema Solar, reduzindo o tempo de observação.
Quando e como poderei observar o 3I/ATLAS?
A partir de 25 de novembro de 2025, telescópios equipados com filtros de alta sensibilidade podem localizar o cometa a magnitude 12, próximo da constelação de Sagitário. Observadores amadores precisarão de equipamentos de 8 polegadas ou maiores.
O que os cientistas esperam aprender com a possível interação do cometa com uma ejeção de massa coronal?
Se confirmada, a interação pode mostrar como partículas solares alteram temporariamente a composição de cometas, influenciando a liberação de gases e a estrutura da coma. Isso ajudará a refinar modelos de comportamento de objetos gelados sob condições extremas.
Qual a relevância do 3I/ATLAS para a busca de vida fora da Terra?
A presença de compostos de carbeto sugere que sistemas estelares antigos podem ainda gerar matéria pré‑biológica. Estudar esses materiais pode oferecer pistas sobre os blocos de construção que, em outros ambientes, poderiam evoluir para formas de vida.